Laurent Gaudé.(2014). Noite dentro, Moçambique.ASA
Laurent Gaudé pode ser um escritor pouco conhecido
entre nós, portugueses, mas nem por isso é menos interessante.
Noite
dentro, Moçambique é uma coletânea de quatro contos:
Sangue negreiro, Gramercy Park Hotel, O coronel Barbaque e Noite dentro,
Moçambique.
Todos têm um registo narrativo diferente. Vamos
falar do primeiro conto.
Em “sangue negreiro”, aborda-se o tema da
escravatura, por vezes já esquecido na atualidade, mas ainda tão real. Um navio
mercante francês, cuja mercadoria principal era constituída por um grupo de
escravos negros é forçado a regressar a França por morte do seu comandante, de
modo a que fosse sepultado em solo francês.
Aqui, acontece o inesperado: os escravos fogem do
navio mas, após algumas horas, são capturados e a calma restabelece-se.
Contudo, ao verificarem melhor, constatam que ainda se encontra um escravo a
monte, que ninguém consegue encontrar. No entanto, ele vai deixando as suas
marcas em toda a localidade e afeta psicologicamente o novo comandante do
navio, que não vive a realidade da escravatura pacificamente.
Eis o primeiro parágrafo do conto narrado na
primeira pessoa, o comandante do navio:
“Observam-me.
Assusto-vos. Há na minha tez algo de febril que vos inquieta. Sorrio.
Estremeço. Um homem queimado, pensam. Não levanto os olhos. Sobressalto-me
muitas vezes, ao mínimo ruído, ao mínimo gesto. Estou ocupado a lutar contra
coisas que não veem, nem sequer seriam capazes de imaginar. Lamentam-me, e têm
razão. Mas nem sempre fui assim. Era um homem, dantes.”
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